Lançado em 15 de janeiro de 2015, o
filme “Livre” (Wild) baseado em um best-seller autobiográfico tem
emocionado expectadores do mundo todo. Me lembrou em partes o filme “Na
Natureza Selvagem” (Into the Wild) de 2008, também baseado em um livro
biográfico. Ambos livros/filmes contam a história de seres humanos perdidos
emocionalmente, tentando se encontrar de alguma forma “perdendo-se” na
natureza.
“Livre”
conta a história de Cheryl Strayed, jovem estadunidense inteligente e saudável,
que vive graves problemas pelo casamento arruinado e pelo luto profundo em
razão da morte da mãe. As formas com que a garota tenta fugir da tristeza não
são nada sábias e ela acaba sendo sugada cada vez mais para situações de
tristeza, solidão e esgotamento emocional. Para tentar se encontrar e descobrir
um pouco mais sobre a beleza da vida que sua mãe tanto insistia em lhe mostrar,
Cheryl decide percorrer a Pacific Crest Trail (PCT), uma trilha de 1.770 km pela costa oeste
dos Estados Unidos.
“Na
Natureza Selvagem” conta a história de Christopher
McCandless, um jovem estadunidense recém-formado na faculdade, que decide
percorrer uma longa jornada saindo de Atlanta em direção ao Alasca. Ele parte
para essa viagem sem avisar sua família, que ficou sem notícias até o fim.
Chris era aventureiro e sonhador, não concordava com o sistema econômico, o qual achava materialista e
opressor. Tinha problemas de
relacionamento com a família, em especial com o pai. Era ressentido por causa
das mentiras e memórias dolorosas de violência verbal, brigas, rispidez, falta
de diálogo por parte dos pais.
Tanto Cheryl quanto Chris entram na natureza
sozinhos, deixando para trás as pessoas que os amavam, para longos dias de
autoconhecimento, reflexão, desafios físicos e mentais, experiências únicas de
êxtase e também de desespero. Ambos levam consigo seu repertório de autores que
os inspiram: poemas, livros, músicas. Ambos são leitores vorazes e encontram
companhia nos seus autores favoritos. Fazem deles seus amigos íntimos. Fazem da
natureza sua amiga íntima... Mas muitas vezes a natureza se torna inimiga. Ao
longo da viagem, os dois andarilhos fazem amigos, recebem ajuda, conhecem
outras pessoas e também suas histórias tristes. Observa-se que, embora tenha
existido planejamento para a viagem, nem Cheryl, nem Chris estavam realmente
preparados para o que se propuseram a fazer. E os problemas que enfrentam
provam isso para eles. Ao fazer esportes radicais, sempre arriscamos a vida,
mas logicamente onde há ignorância o risco é bem maior.
E eis a pergunta: eles encontraram o que estavam
buscando? O que de fato eles estavam buscando? O que de fato NÓS estamos
buscando em nossa jornada? Talvez, por estarem perdidos, ou emocionalmente
conturbados, ou moralmente revoltados e decepcionados, Cheryl e Chris tentaram
buscar na natureza respostas para seus dilemas. Talvez estivessem tentando
descobrir sua verdadeira identidade. A solidão realmente ajuda quando queremos
refletir. Contudo, de acordo com C. S. Lewis, “se você adota a natureza como
mestra, ela lhe ensina exatamente as lições que você decidiu aprender
antecipadamente; em outras palavras, a natureza não ensina. (...) O único
comando que a natureza expressa é: observe; ouça; fique atento” (LEWIS, 2013,
p. 28).
Em “Livre” e em “Na Natureza Selvagem” não há
menção de nenhuma forma de relacionamento dos protagonistas com Deus. Talvez
algum tipo de crença ou misticismo, mas não há um relacionamento real, uma fé
sólida. E isso é crucial. O ser humano tenta encontrar sua identidade de muitas
formas: nos autores que gosta, na profissão que exerce, nos filósofos que
concorda, nos amigos que admira, no estilo de vida que ostenta... Mas a nossa
identidade não está aí. Parece ser lógico que quanto mais eu me conheço, mais
nítida e sólida é minha identidade, mas não funciona assim. Para saber quem sou,
preciso saber quem Deus é. A lógica é: quanto mais eu conheço a Deus, mais eu
conheço o ser humano, pois a identidade do ser humano está em Deus. Para ler mais sobre
isso sugiro o autor Soren Kierkegaard, que mostra em sua obra que a cura para
Cheryl Strayed, Christopher McCandless, eu e você, vem em amor, pelo encontro
com a graça de Deus. Só assim podemos ter consciência de quem nós somos.
Quando o ser humano encontra sua identidade em
Deus e com Ele cultiva um relacionamento, situações como as que Cheryl e Chris
passam são vivenciadas sem que sejamos destruídos: enfrentar o luto, as crises no casamento, a necessidade
do perdão, a tomada de decisões, superar desilusões e mágoas, etc. Se, quando estamos sozinhos, encontramos o desespero,
por outro lado, quando estamos em Deus, de acordo com o apóstolo Paulo, há
esperança mesmo que tudo pareça desmoronar. Pois quando estamos fracos aí então
é que somos fortes, porque podemos enfim admitir que precisamos Daquele que é
infinitamente melhor do que nós e nos ama incondicionalmente.
Sem mais mergulhos teológicos, ambos os filmes e, certamente, os respectivos livros que lhes deram origem (posso dizer com certeza
sobre “Na Natureza Selvagem” porque já li. “Livre” pretendo ler em breve) são
imperdíveis e estão no topo da minha lista. Embora eu tenha feito um paralelo,
“Na Natureza Selvagem” é superior e é um dos melhores filmes que eu já vi em
toda a minha vida. Os dois filmes têm uma trilha sonora de alta qualidade,
paisagens magníficas, sugestões de leituras de livros e poemas excelentes,
atuação esplêndida de seu elenco e, é claro, um convite profundo à reflexão
sobre o eu comigo mesmo, o eu com a natureza (criação) e o eu com Deus
(Criador).
Assista aos trailers:
Na Natureza Selvagem
Livre
Referências:
LEWIS, C. S. Os Quatro Amores. São Paulo: Martins
Fontes, 2013, p. 28.
KRAKAUER, J. Na Natureza Selvagem. São Paulo: Cia
das Letras, 2008, 2013 p.
STRAYED, C. Livre. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013,
376 p.
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